domingo, fevereiro 24, 2008

Não votam, portanto.

Soube-se hoje que Portugal é um dos oito países da UE em que se registam os níveis mais elevados de pobreza nas crianças, nomeadamente nas que vivem com adultos empregados.

Mais um número que indica a absoluta negligência com que tratamos as crianças. Já andava para escrever sobre isto há uns dias. Antes que chegue o dito relatório, ficam algumas impressões.

A protecção à infancia no nosso país, discursos balofos à parte e roteiros contra a exclusão inócuos de lado, é MISERÁVEL.

As instituições que deveriam acolher e proteger as crianças e jovens em risco "funcionam", na maioria das vezes, com deficiências gravíssimas. Frequentemente, reproduzindo os modelos preversos que os menores vítimas aprenderam antes de saberem falar.
Não se espantem, depois, que menores institucionalizados cometam crimes violentos.

Voltarei a este assunto com maior detalhe. Para já, atentem em três dados do Plano de Intervenção Imediata. São números oficiais. Temo que os reais sejam bem piores.

1. Cerca de metade das instituições de acolhimento encontra-se em situação de sobrelotação, recebendo muito mais crianças do que a sua capacidade permite, vendo constrangidas, por isso, as devidas condições de acolhimento e de tratamento individualizado às crianças.

2. Cerca de 30% das instituições não dispõem de Equipa Técnica (apesar do disposto legal), sendo que um número considerável diz respeito a Lares de Infância e Juventude ( a valência onde as crianças passam mais tempo e podem ir ficando “até exisitir alternativa”, isto é, até à maioridade).

Vale a pena sublinhar que se passaram os Orfanatos a Lares sem a necessária reestruturação. Como é que um orfanato, assente no modelo caridade-gratidão pode, de um dia para o outro e sem os necessários recursos, receber apenas crianças e jovens em risco, para as quais se exige uma resposta especializada?

Pretendiam criar Lares com respostas terapêuticas para menores vítimas - assistindo aos pobres em meio natural de vida- mas, sem directores técnicos (enquanto os directores continuarem a ser teológos ou freiras), sem um quadro técnico com formação específica e supervisão adequada, foi pior emenda do que o soneto.

Juntam-se, numa mesma casa, um grupo de crianças perturbadas, de vários escalões etários e um conjunto de adultos sem qualquer formação adequada. Os resultados? Todos sabem, ninguém gosta de falar: abusos sexuais, agressões e até homicídios.


3. Ainda existe uma quantidade significativa de instituições que impedem o contacto presencial entre a família e a criança acolhida Esta situação representa não só uma grave limitação do direito da criança e da família, como poderá traduzir uma dificuldade em percepcionar a realidade da criança acolhida.


Existem outras situações calamitosas, como as Casas de Emergência que deviam acolher crianças durante um máximo de 20 dias, mas que recebem menores durante meses ou anos, a dormir no chão.
Ou, por exemplo, o facto da classificação necessária para que as crianças usufruam de medidas de educação especial estar a ser feita a partir da Classificação Internacional de Funcionalidades (CIF)... para Adultos!

Enfim…voltarei a este tema, como disse.
Para já, a conclusão é evidente: o Estado está a falhar com as crianças vítimas, com os mais vulneráveis entre os vulneráveis.