terça-feira, setembro 26, 2006

Os Turcos, José, Ângela e o Papa

José Manuel Durão Barroso é um político…habilidoso. No princípio do ano, declarou que tinha alinhado com Bush, na invasão do Iraque, com base em falsas informações, embora essa aprovação lhe tenha valido o apoio de Blair para a presidência da Comissão Europeia. Contudo, e como então notava aqui Medeiros Ferreira, com a confissão do erro, Barroso passou gozar do apoio do eixo franco-alemão.
Pois é. Barroso tem um fino sentido de oportunidade. Há não muito tempo atrás, afirmava, peremptoriamente: “In the foreseeable future we will not have a constitution - that's obvious”. Agora, para justificar a sua opinião sobre o congelamento da expansão da UE, diz: "It would not be wise to proceed with any further enlargement before we have dealt with the constitutional issue”.
Ou seja, protelar, sem prazo, a entrada da Croácia e da Turquia, baseia-se nesta mudança de posição que, para além do mais, agrada, outra vez, à Alemanha.
Para a Turquia, e para todos os europeus, este adiamento tem consequências significativas. Há dois anos atrás, a UE deu uma resposta favorável à Turquia. Agora, o vento sopra para o outro lado. Para o lado da posição do Papa Bento XVI, que defende que a Turquia deve pertencer “a outro continente”.
E é lamentável que assim seja. A entrada da Turquia para a UE que, evidentemente, e tal como todos os outros estados membros ou em adesão, deverá corresponder com uma série de reformas, é fundamental. A UE não é um contorno geográfico. E muito menos é um projecto religioso. Contudo, a verdade é que é este último traço que impera, já que os argumentos económicos e relativos à migração, não colhem. A Turquia tem 70 milhões, mas a entrada dos últimos estados membros foi equivalente e com resultados positivos. As experiências anteriores mostram que a adesão não é um factor de imigração.
Não sou cristã e sou europeia. Não posso aceitar a Europa como um projecto cristão. E prefiro ter a Turquia como parte integrante da UE, do que a Turquia às suas portas aferrolhadas. Prefiro uma Turquia com uma religião diferente, mas com princípios comuns, do que uma Turquia rancorosa com as promessas adiadas, afastada e guetizada. E espero que na história da radicalização do Médio-Oriente, não conste a rejeição da Turquia pelos europeus.
Suspendendo o processo de alargamento, Barroso agrada à chancelerina e ao Papa. Ao poder económico e religioso. À sua própria sobrevivência. Mas falha em perceber o essencial da União Europeia. Trata-se de um projecto político.