Constituição ou Justiça?
O prazo para a votação da Constituição, pelos deputados iraquianos, voltou a ser dilatado. A Constituição deveria ter sido apresentada no passado dia 15 de Agosto. Caso contrário, o parlamento deveria ter sido dissolvido e novas eleições convocadas. O parlamento iraquiano evitou este “embaraço” alterando a constituição interina e adiando o texto para dia 22 de Agosto. Anteontem, contudo, e pouco antes da meia-noite, anunciou novo adiamento. Assim, sem o Supremo Tribunal (que já deveria ter sido criado) e com a aquiescência do parlamento, este processo constitucional vai reduzindo-se a um acordo entre Presidente e Primeiro-Ministro. E, sobretudo, a uma negociata entre curdos e xiitas, da qual, evidentemente, os sunitas se queixam.
Como sublinhava o Editorial do NY Times de ontem, há uns meses atrás Bush garantia que o secularismo dos curdos bloquearia a teocracia dos xiitas, enquanto esta limitaria o separatismo dos curdos. Na verdade os dois grupos aliaram-se e Washington, desesperado por uma qualquer constituição, foi cúmplice.
No anúncio deste novo adiamento, foram dadas garantias que não seriam feitas alterações ao princípio do federalismo, em relação ao qual xiitas e curdos estão de acordo, mas que conta com a oposição dos sunitas. O texto faz do Iraque uma federação, com fraca administração central e governado pela lei islâmica. Sobre isto, vale a pena destacar:
Artigo 2, 1º parágrafo: O Islão é a religião oficial do Estado e é uma fonte fundamental de legislação.
(Obviamente que sendo definido como fundamental, tornar-se-á imperioso)
a) Nenhuma lei que contrarie o essencial da lei islâmica poderá ser legislada.
(A versão anterior referia-se apenas ao Islão. Agora explicita lei islâmica)
Os 3 dias concedidos para a apresentação final do texto constitucional não contemplam a inclusão da igualdade entre homens e mulheres, ficando estas à mercê da Shariah. Podem ser subjugadas em nome de Deus, o que pode ir desde menores direitos no casamento, divórcio e heranças até a casamentos forçados, tortura, prisão e morte.
Os sunitas (maioritários em pelo menos 4 regiões) não apenas pretendem a unidade territorial e um governo central forte, como temem que o federalismo tenha como consequência a perda de poder, nomeadamente económico, já que se concentram nas províncias que não têm petróleo. Como a lei provisória estabelece que a Constituição pode ser rejeitada no referendo de 15 de Outubro, se 2/3 dos eleitores em 3 das 18 províncias votarem contra, a possibilidade de não ser aprovada existe. As províncias de Anbar e Salah al-Din provavelmente rejeitarão a Constituição. Noutras províncias como Ninevah, Diyala Baghdad e Babil o Não é menos provável, mas possível. De facto, insistindo no privilégio do veto, os curdos poderão ter dado aos sunitas o instrumento ideal para a rejeição.
Em que dará este federalismo, como distribuir os lucros do petróleo, como conciliar o Código Civil com as liberdades de exercício das convicções religiosas garantidas aos cidadãos (artigo 39), o que aconteceria caso fossem convocadas novas eleições, os riscos do aumento do descontentamento dos sunitas e da insurgência, a possibilidade da guerra civil, são questões que continuam perigosamente a pairar. Na verdade, os EUA querem acelerar a todo o custo este suposto processo democrático no Iraque. Bush, com a sua popularidade a baixar paulatinamente e com a oposição à guerra a fermentar de dia para dia, necessita desesperadamente desta constituição. Mas note-se que o seu comité apenas ficou formado em meados de Maio, deixando apenas 3 meses para a sua redacção.
O projecto constitucional é uma das vértebras para o processo democrático (minado desde o início), mas a pressa e as pressões dos xiitas poderão transformá-lo num texto sobre quem manda no país. Num pesadelo. É evidente que o Iraque precisa de uma constituição. Mas precisa mais de um acordo justo.
Como sublinhava o Editorial do NY Times de ontem, há uns meses atrás Bush garantia que o secularismo dos curdos bloquearia a teocracia dos xiitas, enquanto esta limitaria o separatismo dos curdos. Na verdade os dois grupos aliaram-se e Washington, desesperado por uma qualquer constituição, foi cúmplice.
No anúncio deste novo adiamento, foram dadas garantias que não seriam feitas alterações ao princípio do federalismo, em relação ao qual xiitas e curdos estão de acordo, mas que conta com a oposição dos sunitas. O texto faz do Iraque uma federação, com fraca administração central e governado pela lei islâmica. Sobre isto, vale a pena destacar:
Artigo 2, 1º parágrafo: O Islão é a religião oficial do Estado e é uma fonte fundamental de legislação.
(Obviamente que sendo definido como fundamental, tornar-se-á imperioso)
a) Nenhuma lei que contrarie o essencial da lei islâmica poderá ser legislada.
(A versão anterior referia-se apenas ao Islão. Agora explicita lei islâmica)
Os 3 dias concedidos para a apresentação final do texto constitucional não contemplam a inclusão da igualdade entre homens e mulheres, ficando estas à mercê da Shariah. Podem ser subjugadas em nome de Deus, o que pode ir desde menores direitos no casamento, divórcio e heranças até a casamentos forçados, tortura, prisão e morte.
Os sunitas (maioritários em pelo menos 4 regiões) não apenas pretendem a unidade territorial e um governo central forte, como temem que o federalismo tenha como consequência a perda de poder, nomeadamente económico, já que se concentram nas províncias que não têm petróleo. Como a lei provisória estabelece que a Constituição pode ser rejeitada no referendo de 15 de Outubro, se 2/3 dos eleitores em 3 das 18 províncias votarem contra, a possibilidade de não ser aprovada existe. As províncias de Anbar e Salah al-Din provavelmente rejeitarão a Constituição. Noutras províncias como Ninevah, Diyala Baghdad e Babil o Não é menos provável, mas possível. De facto, insistindo no privilégio do veto, os curdos poderão ter dado aos sunitas o instrumento ideal para a rejeição.
Em que dará este federalismo, como distribuir os lucros do petróleo, como conciliar o Código Civil com as liberdades de exercício das convicções religiosas garantidas aos cidadãos (artigo 39), o que aconteceria caso fossem convocadas novas eleições, os riscos do aumento do descontentamento dos sunitas e da insurgência, a possibilidade da guerra civil, são questões que continuam perigosamente a pairar. Na verdade, os EUA querem acelerar a todo o custo este suposto processo democrático no Iraque. Bush, com a sua popularidade a baixar paulatinamente e com a oposição à guerra a fermentar de dia para dia, necessita desesperadamente desta constituição. Mas note-se que o seu comité apenas ficou formado em meados de Maio, deixando apenas 3 meses para a sua redacção.
O projecto constitucional é uma das vértebras para o processo democrático (minado desde o início), mas a pressa e as pressões dos xiitas poderão transformá-lo num texto sobre quem manda no país. Num pesadelo. É evidente que o Iraque precisa de uma constituição. Mas precisa mais de um acordo justo.
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