domingo, março 04, 2007

Porque não assinei

Corre na academia um abaixo-assinado de professores e investigadores de História sobre o programa televisivo dos Grandes Portugueses.Embora perceba as preocupações subjacentes ao texto não o assinei por me parecer haver uma confusão de géneros na matéria.
Em primeiro lugar, o programa em questão não é um programa de História mas um formato televisivo de entretenimento cuja matriz é britânica, país que tem dispensado muitos herois e santos, e que detesta ditadores.Nunca ocorreu à BBC que alguma votação pudesse ter algum grão de ciência antes se situando no mundo da opinião e das preferências subjectivas e identitárias dos telespectadores.
Em segundo lugar, e por essa razão, tanto podia aparecer bem colocado um personagem histórico como uma vedeta de variedades ou do desporto.Em Portugal onde todos os mal e bem pensantes detestam a política é que apareceram personalidades históricas carregadas de significado político.Em vez da S. Isabel com as rosas apareceu Afonso Henriques com a espada; em vez de Pedro Nunes com o nónio exaltou-se D.JoãoII perdoando-lhe o erro com Colombo;em vez da voz de Amália ou de José Afonso, os retratos de Salazar; no lugar que podia ser de Eusébio ou Coluna surgiu Álvaro Cunhal com o martírio português e o messianismo comunista.
A RTP a partir de certa altura tropeçou em Salazar e nunca mais recobrou a serenidade tantas são as criaturas que expiam em silêncio qualquer coisa e o neo-salazarismo recalcado.
Agora são os historiadores que não se revêem na apresentação de personagens, ou de situações, que tratam preferencialmente nas universidades e nos seus livros.Mas os cidadãos não são alunos e a televisão deixou de ser educativa há muito perante a indiferença das elites.Um manifesto cívico alertando para os perigos da mitificação histórica talvez fizesse sentido.Uma lição universitária contra a televisão não se compreende.
Este programa , que a RTP deu a impressão de jamais saber bem o que fazer com ele, teve o mérito de nos devolver a imagem atávica e acrítica que os portugueses têm da sua história há dezenas de anos.Por responsabilidade de quem?Aí está um bom campo de investigação para a Universidade...